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19/02/2019

A construtora do meu condomínio tem valor diferenciado de taxa condominial. Isso é legal?

A construtora do meu condomínio tem valor diferenciado de taxa condominial. Isso é legal?

Não são raras as vezes que nos deparamos com Convenções de Condomínio estipulando taxas condominiais diferenciadas para as unidades da Construtora/Incorporadora ainda não comercializadas. Por vezes, tais percentuais representam um decréscimo de 20 ou 30%, chegando, em alguns casos, a 50 ou 70% do valor da taxa dos demais condôminos.

 

E por que isso ocorre?

Nos termos do artigo 32, j, da Lei 4591/64 o incorporador, para negociar as unidades autônomas de um novo empreendimento, deverá, dentre outras obrigações legais, arquivar no cartório competente de Registro de Imóveis a minuta da futura convenção de condomínio que regerá a edificação ou o conjunto de edificações. Essa minuta é por ele elaborada unilateralmente para, posteriormente, ser aprovada na assembleia inaugural do condomínio.

 

Ocorre que, em inúmeros casos, na Assembleia de Instalação do condomínio, a Construtora/Incorporadora ainda se apresenta como proprietária de mais de 2/3 das frações ideais o que lhe garante a aprovação do regramento interno tal qual elaborado e valida todas aquelas cláusulas por ela unilateralmente estipuladas.

 

Mas essa cobrança diferenciada das taxas condominiais, ensejadora de condições extremamente favoráveis à Construtora/Incorporadora é legal?

 

A resposta a essa questão é negativa, e aqui, vamos nos valer do princípio constitucional da isonomia, que possui como premissa a impossibilidade de distinções de quaisquer naturezas às pessoas que se encontram em situação fática semelhante. Percebam que aqui há um caráter relacional cuja função é evitar discriminações e privilégios desarrazoados e injustificáveis.

 

Ora, a Construtora, enquanto detentora de unidades ainda não comercializadas, se encontra na mesma situação jurídica daquele condômino que adquiriu o imóvel para sua própria moradia ou para investimento. Ambos são proprietários de unidades autônomas, não havendo um fator de discrímen razoável a ensejar diferença de tratamento, sob pena de quebra do princípio da paridade e enriquecimento indevido da Construtora em detrimento dos demais condôminos.

 

A conclusão, portanto, é a de que as cláusulas da convenção, estipuladas unilateralmente pela Construtora/Incorporadora, e que lhe conferem benefícios não extensíveis aos demais proprietários, revelam-se abusivas.

 

Essa questão já foi trabalhada pelos nosso Tribunais, e aqui sintetizamos com uma decisão do TJDF que, ao se debruçar sobre o tema, assim se manifestou:

 

“(...) A inserção de cláusula, no estatuto do Condomínio, concedendo à Incorporadora do empreendimento isenção de 50% (cinqüenta por cento) da contribuição condominial quando figurava, ao tempo da aprovação, como proprietária de mais de dois terços das frações ideais, configura flagrante privilégio pessoal outorgado em detrimento dos demais condôminos. 5. É nula a cláusula de Convenção de Condomínio que isenta parcialmente a Incorporadora do pagamento da taxa condominial das unidades não destinadas à venda, quando ela detém mais de 1/3 (um terço) das frações ideais do Condomínio, inviabilizando qualquer alteração posterior, desde que não tenha sido objeto de ratificação pelos condôminos em Assembleia Geral e não seja extensível aos demais proprietários não residentes no local.[1](g.n)

 

Devemos ter em mente, portanto, que a autonomia privada exercida pela Construtora/Incorporadora quando da elaboração da Convenção, não pode ser exercida de forma abusiva, cabendo ao Poder Judiciário afastar cláusulas convencionais que ferem de morte os princípios da isonomia, boa fé e da função social, sob pena de se instaurar no condomínio o poder absoluto de um só!

 

 

Fábio Barletta Gomes é advogado em Belo Horizonte, especialista em Direito Condominial. Sócio da Barletta & Oliveira Advogados Associados. É professor de Direito Condominial, palestrante e autor de diversos artigos sobre direito condominial, publicados nos mais variados canais e revistas especializadas. Autor do livro Gestão Condominial Eficiente. Coordenador do Curso de Qualificação de Síndicos do Grupo B&O

 

 


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